Talvez a saída estivesse na fotografia. Então comprou uma câmara último tipo, sem imaginar que teria dificuldade de dominá-la. Mas o manual lhe surpreendeu: eram dezenas de páginas. Decidiu domar o equipamento praticando.
O primeiro ensaio foi no mais poético lugar de sua cidade: o Jardim Botânico do Rio de Janeiro.
O primeiro clique perdeu-se na confusão dos botões e ajustes da máquina. Viu um macaco-prego, mas ele sumiu na folhagem antes de Sônia conseguir enquadramento.
“Bela máquina. Posso ajudar?”
Ela se voltou e deu com a presença de um homem enorme, parecia saído de uma daquelas antigas propagandas de cigarro.
Ele pegou a máquina da mão de Sônia e começou a lhe confiar algumas dicas. Ela se impressionou com a elegante cortesia despropositada do rapaz.
“Conheço uma árvore que, nessa época do ano, solta uma resina que atrai inúmeras borboletas”. Sônia não recusou o convite.
Caminharam por entre espécies únicas, raras, e sileciosamente se aproximaram da tal que ele mencionara. De fato, estava florida de borboletas. Várias eram os tipos. Muitos seus tamanhos.
Mais do que Sônia, ele parecia maravilhado. Começou a disparar ininterruptamente. Concentrado, era como se cumprisse uma obrigação. Havia uma urgência em cada pose que clicava. Eram tantos os disparos que não davam chance de Sônia fotografar também.
Ao final ela conseguiu fazer uma pose apenas. Não das borboletas, mas de um instante congelado daquele misterioso fotógrafo que saltara do nada.
Depois daquele dia, voltou algumas outras vezes a encontrá-lo no Jardim Botânico. Sempre gentil, desvendava para ela os mistérios escondidos por trás dos ajustes da sua pesada máquina fotográfica. E confidenciava onde encontrar os mais nobres tons de verde irradiados pelos milhões de pigmentos das folhagens daquele jardim imperial.
Depois o cara sumiu. Passaram-se semanas, meses. Sônia nunca mais o reencontrou. A pesar disso, seu acervo multiplicou-se. E tantos foram os elogios das amigas, que tomou coragem e se inscreveu no concurso de fotos da Associação dos Amigos do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Elas estavam certas: a nova fotógrafa foi laureada com o terceiro lugar, justamente com aquela sua primeira chapa de um desconhecido, fotografando borboletas em transe.
Com a divulgação daquela imagem, ela descobriu que o rapaz era um dos mais experientes fotógrafos do Jardim Botânico. O acervo dele compunha inúmeras publicações.
Procurou-o. Sem sucesso.
Foi um choque quando soube que seu mestre havia morrido, e não há pouco tempo. Estranho.
Naquela tarde, voltou ao jardim como se ali pudesse encontrar a resposta. Uma lembrança, um vestígio.
Procurou o local da foto. Quem sabe sentiria a presença do mestre. Buscou a tal árvore, mas não a encontrou. Dirigiu-se à Administração. Os biólogos responsáveis não souberam dar notícia de tal espécie, muito menos da resina, nem de borboletas em transe.